SETOR EXTERNO

O Impacto da Crise Internacional

 

Desde meados de agosto, com a decretação por parte da Rússia de uma reestruturação unilateral de sua dívida interna e de moratória sobre parte da dívida externa, encerrou-se claramente um ciclo com relação as economias ditas emergentes. Os mercados financeiros internacionais fecharam-se para a economia brasileira, que passou a perder diariamente grandes montantes de suas reservas internacionais. Com isso, a política econômica do governo, baseada justamente no financiamento voluntário de seu déficit de transações correntes, se viu numa encruzilhada, fruto das "armadilhas da estabilização" por nós apontadas no número anterior do Ecosys.

Esta situação tornou as contradições da atual política econômica evidente para todos. A armadilha da ancora monetária se tornou um mecanismo gerador de instabilidade, diante de uma dívida pública em rápido crescimento, em função das enormes taxas de juros que foram decretadas pelo governo após Outubro de 97 e da incapacidade do governo em equilibrar seus resultados primários . O governo enveredou por uma estratégia nitidamente ortodoxa, abandonando os aspectos hetedoxos do Plano Real. Agora, ainda que em caráter "preventivo", o que importa é estabelecer parâmetros capazes de pavimentar os caminhos de um acordo com o FMI. A redução rápida do déficit público - antes relegada a segundo plano, como chamamos a atenção também aqui no Ecosys- passou significar a tábua de salvação do Real, já que negar mudanças na política cambial se tornou o ponto de honra do Governo.

Além disso o governo respondeu ao intenso fluxo de saída de capitais do final de agosto e de setembro (com as reservas declinando cerca de US$ 21 bilhões apenas neste último mês) com uma nova elevação das taxas de juros para mais de 40% ao ano, numa política arriscada quanto ao desempenho da economia brasileira.

Além disso, deu-se prioridade nas medidas de ajuste fiscal à redução dos gastos em "Outros Custeios e Capital" - que reúne despesas com a área social do Governo Federal - de R$ 8,7 bilhões , como os já conhecidos reflexos sobre os serviços de educação e saúde. As medidas incluem também um aumento na contribuição dos ativos (para 20% do que exceder R$ 1.200,00) e introdução do desconto nos pagamentos a inativos, além de não prever nenhum reajuste nos salários dos servidores em 1999. Outro item problemático é o que determina medidas de ajuste aos estados, resultando não apenas na redução dos gastos com pessoal mas também em cortes importantes nos seus gastos com investimentos , como condição para renegociarem suas dívidas com o governo federal.

 

Os próprios analistas oficiais reconhecem que uma política fiscal contracionista com enormes taxas de juros implicará numa expressiva queda do crescimento, que tem se mantido em níveis reduzidos desde a adoção do Plano Real. O governo aposta num ajuste de curto prazo, com a queda do crescimento se estendendo até no máximo o terceiro trimestre de 1999. Aposta também na recuperação do mercado pela redução dos níveis de endividamento e inadimplência, o que não corresponde, como vimos anteriormente, à realidade. Finalmente, aposta no sucesso do acordo com o FMI na recuperação das expectativas positivas quanto à economia brasileira , para que o credito internacional voluntário volte ao Brasil já no próximo ano. Aparentemente o governo acredita em estratégias de curto prazo para tentar resolver problemas estruturais. E, ao fazê-lo, pode estar criando ainda maiores problemas, fragilizando o setor público e aumentando o já expressivo endividamento externo. A grande questão que se coloca é : será possível recuperar os fluxos internacionais de capital a tempo de sanar as lacunas nas transações correntes? Se não, há um plano de contigência estruturado?

A Balança De Transações Correntes no mês de setembro

O déficit em transações correntes situou-se em US$ 4,9 bilhões no mês de setembro, com resultados deficitários de US$ 801 milhões na balança comercial e de US$ 4,2 bilhões em serviços. O acumulado do ano alcançou US$ 23,5 bilhões (4,03% do PIB), 4,16% abaixo do mesmo período em 97. O déficit comercial acumulado até setembro, US$ 3,8 bilhões, foi inferior em 34,1% ao ocorrido no mesmo período do ano anterior. No mês, entretanto, o déficit da balança comercial foi superior ao de agosto em razão do crescimento das exportações, inferior ao das importações.
O crescimento das despesas líquidas com serviços, que passaram de US$ 2 bilhões em agosto para US$ 4,2 bilhões em setembro, deveu-se principalmente à elevação do pagamento líquido de juros da dívida externa e da remessa líquida de lucros e dividendos. O gasto líquido com viagens internacionais aumentou 52,2% em relação a agosto.

O ingresso de investimentos estrangeiros diretos somou US$ 2,5 bilhões em setembro, sendo US$ 493 milhões relativos a privatizações. As saídas foram de US$ 201 milhões, resultando investimentos líquidos de US$ 2,3 bilhões. Em setembro, as reservas internacionais atingiram US$ 45 bilhões no conceito caixa e US$ 45,8 bilhões no conceito liquidez internacional, com queda de US$ 21,5 bilhões relativamente a agosto.

 

 

Medidas do Governo

 

O governo adotou, recentemente uma série de medidas com o intuito de melhorar o desempenho comercial do país frente ao elevado déficit em conta corrente - que em setembro representou uma taxa acumulada em 12 meses de 4,37% do PIB -, agravado pelas turbulências no cenário externo.

Algumas barreiras não-tarifárias foram introduzidas para restringir as importações, como o estabelecimento de fiscalização sanitária e fitossanitária de produtos agrícolas, a exigência de um maior controle de qualidade e a introdução de normas técnicas.

Pela lado das exportações, o governo vai realizar uma redução dos prazos do PROEX - principal programa de estímulo às exportações - com o intuito de aumentar a lista de produtos beneficiados por esta linha de financiamento e adequá-lo à prática do mercado internacional. Esta proposta prevê alterações tanto no que diz respeito aos prazos do financiamento direto quanto aos de equalização da taxa de juros. A redução dos prazos dos financiamentos diretos também pode constituir uma alternativa ao Adiantamento de Contrato de Câmbio (ACC) e ao Adiantamento de Contrato de Exportações (ACE) devido às dificuldades do exportador brasileiro de captar recursos no exterior.

 

Voltar ao Índice