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Economia Brasileira

Integração dos ricos e desintegração
dos pobres MC Tavares
 Livre negociação, pescoço guilhotina Aloizio Mercadante

 

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Economia Internacional
 Dilemas da política monetária 
Luis Gonzaga Beluzzo
Globalização e mais competitividade não
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Integração dos ricos e desintegração dos pobres 

MARIA DA CONCEIÇÃO TAVARES

A riqueza em suas várias formas, da imobiliária à mobiliária, é verdadeiramente o único fenômeno global que ampliou e homogeneizou os padrões de comportamento das elites cosmopolitas mundiais. Pode-se dizer que esse tipo de "globalização" produziu finalmente uma burguesia internacional que extrapolou o reduzido grupo da "aristocracia dos negócios" do mundo anglo-saxônico do final do século 19 e do começo do século 20. Hoje, a chamada "sociedade civil" internacionalizada inclui desde os milionários sauditas, asiáticos e latino-americanos até os capo das máfias internacionais dos negócios das drogas e das armas, numa promiscuidade celerada. A "sociedade globalitária" organiza-se em várias redes cruzadas transnacionais, de comunicação de burocracias privadas e públicas que servem de intermediárias no mundo dos negócios, além de agentes ostensivos ou secretos do poder político da "pax americana". Na geoeconomia do comércio e das finanças internacionais, o movimento de expansão e concentração do capital foi realizado sob o comando das redes de corporações e de bancos transnacionais. Apesar do aumento das relações extrafronteiras, o peso do grande capital de países de origem anglo-saxônica continua dominante. O paraíso dos ricos, porém, começou a expandir-se sobretudo a partir da especulação nos mercados de euromoedas e da proliferação de paraísos fiscais em todas as regiões fronteiriças do mundo, apoiados nas políticas de liberalização das contas de capitais com o exterior que se acelerou nas últimas duas décadas (nos dados de origem do investimento direto estrangeiro do Banco Central, a importância de Cayman foi de 22% do IDE em 1997). Em termos de volume de negócios, as praças financeiras de Wall Street e de Londres converteram-se em megacentros interligados, a partir dos quais as grandes empresas e bancos puderam operar o gigantesco endividamento externo dos EUA e, ao mesmo tempo, alterar o perfil da riqueza privada, acentuando a sua forma mobiliária e seu caráter rentista e especulativo. A pobreza proliferou com o aumento do desemprego, com a precarização das condições de trabalho e com a destruição da pequena produção independente em vastas regiões do mundo subdesenvolvido. Tornou-se, porém, cada vez mais heterogênea tanto pela diferenciação crescente dos valores monetários do "custo de reprodução" da subsistência urbana e rural em distintos países como pelas estratégias de sobrevivência física e social, que são extremamente variáveis em termos regionais e culturais. No plano multinacional, encontram-se organizações não-governamentais em rede, que tentam combater a fome e lutar pela vida em várias partes do mundo, nos centros metropolitanos e nos países periféricos mais atingidos pela violência da desintegração social e política. A maioria delas acabou se unificando em movimentos "antiglobalização neoliberal". No plano nacional, os movimentos sociais organizados, os partidos que mantêm a tradição de esquerda e os Estados nacionais desenvolvidos que não abriram mão de manter um mínimo das conquistas do Estado de bem-estar (o que incluía os EUA até recentemente) têm segurado o desmonte completo das políticas universais de seguridade social. No Brasil de hoje, é urgente enfrentar os problemas da "globalização perversa", sobretudo o da pobreza, o do emprego e o da extensão da rede de proteção social dentro do espaço nacional. Tendo em vista que a onda liberalizante vai continuar em 2002, com a segunda geração de reformas e com as negociações da Alca, comandadas por um novo e mais duro Consenso de Washington e pelas nossas burocracias cosmopolitas, é preciso oferecer uma resistência social e cívica crescente, como a que se verificou recentemente, com o apoio do Poder Judiciário e de parte substancial do Congresso. Por outro lado, defender-se o melhor possível da violência do capital financeiro rentista e especulativo significa não permitir, a pretexto de "financiar o balanço de pagamentos", a entrada de capitais externos privados sem limite e sem controle nem aceitar as regras rígidas do FMI para o financiamento interno das empresas estatais e dos gastos sociais. Anne Krueger, a nova gerente do FMI, acabou de publicar uma proposta para "concordata" da dívida soberana de "países emergentes". Apesar de aparentemente "progressista" porque fala em controle do câmbio e em reestruturação da dívida externa, a proposta é uma racionalização brilhante da posição dos secretários do Tesouro norte-americano e canadense. Está implícita a suposição de que a dívida privada externa (no nosso caso, US$ 130 bilhões, dos quais dois terços são devidos pelas empresas que participaram das privatizações) seja negociada como "dívida soberana" do Estado brasileiro através de um "mecanismo formal" em que o FMI daria o consentimento e arbitraria, em última instância, as negociações. O Brasil não precisa ser uma potência tecnológica e militar para exercer a sua soberania, até mesmo no controle do câmbio e nas negociações com os credores. Precisa de um Estado democratizado e verdadeiramente republicano que seja capaz de defender os interesses da nação. Para isso, terá de mudar as suas bases de sustentação social e política que lhe permitam afastar do governo do país as oligarquias e as plutocracias "globalitárias" que destroem o próprio Estado e a sua capacidade de ação defensiva e de proteção social.